Em debate sobre a política de saúde voltada a HIV/Aids e a hepatites virais, os participantes ressaltaram que os protocolos clínicos e as diretrizes terapêuticas estão desatualizados. Como destacou o vice-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, Veriano Terto, só ocorreram duas revisões desses documentos em 10 anos, em 2013 e 2017. A legislação em vigor prevê que sejam atualizados a cada ano.
Segundo o especialista, a incorporação de novos medicamentos para distribuição gratuita pelo sistema único de saúde é importante, não apenas para assegurar o tratamento de pessoas que vivem com HIV, mas também como estratégia para evitar o desenvolvimento de resistência por parte do vírus. A substituição dos remédios também reduz o risco de ocorrência de reações adversas, o que aumenta a aderência aos tratamentos, de acordo com Veriano Terto.
O assessor da Coordenação-Geral de Vigilância do HIV/Aids e das Hepatites Virais do Ministério da Saúde Ronaldo Hallal adiantou que os novos protocolos já estão em discussão e devem ser publicados ainda este ano. Segundo afirmou, a coordenação está sendo reestruturada, com a recriação das comissões técnicas e da interação com as organizações da sociedade, uma vez que o decreto que tratava desses assuntos foi revogado no último governo.
Conforme Ronaldo Hallal, o Brasil se integra à meta internacional de oferecer diagnóstico e tratamento a pelo menos 95% das pessoas com HIV. No entanto, o país não cumpre a promessa, segundo ele, principalmente devido às iniquidades sociais. Por isso, além de incorporar novas tecnologias e medicamentos ao SUS, ele considera fundamental encontrar formas de ampliar o das populações em situação de maior vulnerabilidade aos serviços de saúde.
“Nós temos uma situação de desigualdade, que, olhando para o aspecto de raça/cor, nós temos desigualdade em relação ao acesso à rede de saúde, de se manter sendo acompanhado na rede de serviços, se manter em tratamento e ter um dos objetivos importantes do tratamento, que é supressão viral, pessoas negras, indígenas, têm menor acesso a esses desfechos que a gente persegue. E isso se repete quando a gente olha escolaridade, quando a gente olha cidades do interior versus capitais.”
Autora do pedido para realização da audiência pública, a deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) concorda que realmente não há como pensar políticas públicas de saúde sem considerar “os recortes específicos” de gênero, raça e localidade onde a população se encontra.
“Os determinantes sociais em saúde precisam estar presentes na elaboração dos planos estratégicos para a gente fazer o enfrentamento, sempre garantindo que mulheres, negras e negros, indígenas, nos territórios mais distantes, população em situação de rua, que fica por vezes à margem de todo e qualquer cuidado, porque tem uma distância que já é absurda nessa relação direta da oferta e também da procura, por conta desses delimitadores que o próprio sistema já tem.”
Os debatedores também levantaram o problema das patentes. Para Veriano Terto, o licenciamento compulsório de alguns medicamentos seria crucial para atender a determinação legal de universalizar o acesso das pessoas com HIV aos medicamentos mais recentes. Na opinião do ativista, além de reduzir o preço dos remédios, a quebra de patentes ainda daria mais autonomia ao Brasil na produção, o que reduziria o risco de desabastecimento.
Veriano Terto questiona especificamente o registro do medicamento chamado Dolutegravir que, segundo afirma, foi obtido de forma irregular. O especialista defende que o remédio seja considerado “de interesse público”, uma vez que é utilizado por mais de 460 mil pessoas no país.
Da Rádio Câmara, de Brasília, Maria Neves
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